terça-feira, 12 de outubro de 2010

O Sonho - X

"Bom dia..." - disse eu a medo quando entrei no gabinete. Não sabia como havia de reagir... com ele, comigo e com o que se havia passado naquela noite.
Na manhã em que acordámos lado a lado senti-me completamente oca... Se por um lado tinha acontecido o que eu mais queria, por outro... Pela primeira vez "ele" não havia conseguido fazer-me sentir completa. O sorriso dele matinal, o ar doce e protector com que me olhou, a forma como me mimou não foram suficientes para me deixar de sorriso congelado nos lábios... o que me deixava bastante confusa!

"Bom dia" - respondeu ele sem me olhar... ele sempre fora mestre em disfarçar as coisas e mais uma vez mantinha-se igual.

O curioso é que eu não conseguía sentir-me bem com tudo o que se tinha passado e estava a começar a sufocar por nem sequer me entender a mim própria... Então não tinha sido isto que eu tinha desejado não só desde que o revi em NY, mas nos últimos 6 anos em que nem sequer sabia onde ele estava? Voltar a estar com ele? Sentir que ele ainda me podia desejar?

Levantei-me e dirigi-me ao gabinete do Sr. Park... precisava de lhe pedir 2 dias de férias. Podia ser absurdo, mas conseguia falar com aquele homem terno como se fosse o meu pai e assim que ele me perguntou se eu estava bem, foi inevitável desmanchar toda a minha armadura e começar a chorar compulsivamente tipo criança em frente a ele. Paternal como sempre, ouviu-me (embora não lhe tenha dado qualquer promenor da minha vida) e concordou em dar-me aquela semana de férias... Segundo ele, era melhor uma pessoa restablecer-se do que estar no trabalho sem qualquer condição para tal.

Voltei ao gabinete, peguei na minha mala e disse "Até amanhã!" sem sequer me explicar... Pilar questionou-me o que se passava, se eu estava bem ao qual eu respondi que não, mas que não era motivo de preocupação. Pelo canto do olho pude ver que quando aquele "não" redondo saíu da minha boca, "ele" arregalou os olhos côr de mel e olhou para mim, como quem esperava uma explicação...

Pela primeira vez, estava sozinha e angustiada em NY... na cidade dos sonhos, do meu em especial... Na cidade que me estava a oferecer tudo aquilo que eu sonhara durante tantos anos... Caminhei durante horas por aquelas ruas escuras e sujas, com cartazes iluminados que encadeavam e magoavam os olhos... Vi crianças a brincar em becos, junto a lixo, a seringas usadas e vidros partidos, vi idosos, ex-combatentes a rir, sentados em vãos de escada a relembrar antigas histórias de momentos perigosos e inesqueciveis das suas vidas... mães solteiras, a correr dum emprego para outro, casais apaixonados que sonham com a felicidade eterna.... e percebi que ali não era o meu lugar... Era somente o meu sítio de passagem!

Fui para junto do rio e sentei-me numa das margens, a apreciar aquela cidade com que sonhei tanta vez... começou a chuviscar e lembrei-me do Rui... O Rui tinha sido o meu último namorado, se é que posso chamar-lhe assim..
Basicamente, foi o único homem que deixei que partilhasse comigo um pouco da minha vida durante os últimos seis anos. Estivémos juntos quase um ano, pouco depois de ter acabado a faculdade. Ele era o homem com que qualquer mulher sonhava mas que era quase impossível de alcançar devido não só à sua beleza, como a tudo o que ele representava na sociedade... Bem sucedido, cheio de contactos, rodeado de mulheres bonitas... este era o Rui... juntando o promenor impensável de que ele foi o meu primeiro chefe!
Até ele assumir que sentia algo por mim foi um processo longo... Homem mais velho, com uma filha e com uma posição profissional que lhe podia causar problemas no caso de relacionamento com uma subordinada. Quando essa conversa aconteceu, eu nem sabia muito bem como reagir uma vez que já tinha fantasiado com ele, mas além de mim, todo o departamento o tinha feito.. o homem era lindo!
Desde essa conversa até ao primeiro jantar foi outro processo complicado... à última da hora, ele desmarcava sempre... havia sempre um imprevisto qualquer. Foi quando comecei a ficar farta deste jogo que ele ganhou coragem e marcou então um jantar, em sua casa. Além de ter cozinhado para mim, fez-me sorrir e acabou a noite a dançar comigo na sala, só com a luz da rua a entrar pela janela.

Foi fácil manter uma relação com ele durante 1 ano... sempre me apoiou e motivou, sempre acreditou em mim e sempre me pôs num pedestal, mas quando saí de Portugal achei que não era justo continuar uma relação com uma pessoa que dava tanto de si para receber tão pouco em troca.
Continuámos sempre a falar, amigos e confidentes. Contei-lhe sobre "ele"... e contei-lhe que "ele" estava em NY comigo e mais uma vez, o Rui tinha me ouvido e aconselhado... Tinha saudades dele e de estar com ele....

Peguei no telemóvel e enviei-lhe uma mensagem... "Preciso de ti, sinto a tua falta... Não me queres vir visitar?!"

3 comentários:

  1. Engraçado ver que a história vai mudar, quero ver onde é que o principal vai ficar. Será que fica contigo ou deixa-te fugir outra vez?

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  2. uhh.. Reviravolta inesperada...

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  3. @ Anónimo - Aqui ninguém deixa/deixou fugir alguém... São opções tomadas, todas com fundamento e razão de ser. Obrigada pela leitura.

    @ Hugo - Uhhhh =) vamos ver, até pode nem dar em nada!! É tudo uma questão de estado de espírito! Beijinho

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