segunda-feira, 25 de outubro de 2010

O Sonho - XIII (my version....)

"Parece-me óptimo. Encontramo-nos então às 11.30 na porta do teu hotel e logo vemos o que fazer durante o dia." - era sexta-feira e era o terceiro dia do Rui comigo em Nova Iorque.
Percebi a sua desilusão no caminho do aeroporto para o centro da cidade quando lhe disse que lhe tinha arranjado uma reserva num hotel "fashion e sofisticado" perto duma das entradas do Central Park.

Era o terceiro dia dele comigo em NY e eu ainda não tinha conseguido abrir a minha boca sobre "ele"... sobre o que me estava a aptecer fazer.

Saí da minha pensão debaixo de uma chuva ligeira... O frio não era demasiado, mas fazia-me procurar conforto no meu sobretudo. Estavamos em Novembro, pouco faltava para o meu aniversário, mas pela primeira vez na vida não tinha qualquer vontade de celebrar. Precisava de entender o que se passava comigo e com "ele" e de perceber o que eu queria duma vez por todas.

Depois de me encontrar com o Rui, seguimos para um café que servia Brunch... Era disso que eu precisava, um pequeno-almoço forte e intenso, para compensar mais uma noite sem dormir....
Doía-me o facto "dele" não me procurar há dois dias... Tentou falar comigo mas à minha resposta seca, não houve luta, não houve persistência! Mais uma vez, acreditava que eu não significava nada para ele e que aquela noite não tinha passado de sexo.
Poderia perder tempo a tentar ler as suas atitudes meigas, carinhosas e atenciosas mas não me valeria de nada... Há 6 anos atrás, eu tinha precisamente me apaixonado por isso tudo... Pelos actos, pelos olhares confortantes, pelos toques de seda da sua pele, pelos silêncios mágicos, pelos sorrisos cúmplices, pelas conversas durante a tarde, a noite... Mas a verdade é que há 6 anos atrás acabámos por nos envolver por quimica sexual, algo que sempre foramos fortíssimos... Só que eu... Gostava dele!
Voltei a lembrar-me da conversa telefónica que tivera com a Rute após poucos dias da minha chegada a NY... se eu o amava?! Continuava a não saber... A palavra "amo-te" nunca me saíra da boca forçada... Saíra sempre em momentos especiais e em momentos em que nem sequer conseguia entender que o íria proferir.. Saía... simplesmente, fluía para fora de mim... e com "ele" nunca acontecera.

"Cat, há muito tempo que não te via com um ar tão infeliz... Que se passa contigo querida?"
"Bom... estou a pensar em ir-me embora de NY..."
"Como?!" - Neste momento o Rui ficou pálido.... - "Este sempre fora o teu sonho!"
"Eu sei.. Mas quando cheguei aqui percebi que este sonho que eu sempre tive, era um sonho diferente do que o que eu estou a viver..."
"Mas não gostas do que fazes?"
"Gosto... mas... só agora é que percebi que não é assim que eu quero aqui estar.... " - o meu estado de ansiedade crescia abundantemente ao ritmo em que o rótulo da garrafa de àgua que eu tinha nas minhas mãos ficava totalmente destruído.
"Não estou a perceber.... Mas... Acho que deves ser feliz e se aqui não és, não fiques... És demasiado bonita para não sorrir a toda a hora." - Pois... e só "ele" é que me conseguia fazer sorrir.

Daí seguimos para Soho porque o Rui queria comprar as ultimas tendências de moda da Grande Maçã. Num desses momentos, aproveitei para telefonar a Pilar... Queria saber como é que ela estava relativamente ao John e queria aproveitar para sacar informações sobre "ele" e o seu comportamento:

"Ele está normal cariño... No me parece triste ou minimamente incomodado."
"Então mas falaste com ele sobre mim?"
"No..claro que no! Sabes que ele não me dá confiança suficiente para lhe perguntar alguma coisa, mas eu vejo que ele está bem..."
"Ahh..." - suspirei longamente, como se me espetassem agulhas por todo o corpo - "mas porque dizes que ele está bem?"
"Porque continua com uma excelente aparência, porque continua altamente concentrado no seu trabalho e porque o Chris veio aqui há pouco ao gabinete combinar uma saída qualquer entre eles hoje à noite e pelo que me apercebi no refeitório quando fui lanchar, até chicas dos alojamentos vão..."
Foi inevitável não deixar cair um par de lágrimas salgadas e quentes pela cara...
"Ok minha querida Pilar... Parece que então ele está mesmo bem.... Olha... queres vir jantar comigo e com o meu amigo hoje?"

Depois de acertarmos promenores para o jantar, quando desliguei o telefone percebi o porquê das minhas dúvidas... desde que o conhecia, faculdade, a nossa "pseudo-relação" de há 6 anos, agora... "ele" NUNCA me tinha dito o que era para ele... o que eu significava para ele... Eu sempre supus muita coisa, mas nunca tive certezas.... Nunca o ouvi dizer se eu era tudo ou se eu não era nada....

Foí aí que pensei na hipótese mais lógica de sempre... eu era tudo aquilo que "ele" idealizava numa mulher... Dava-lhe apoio, confiança... fazia-o sentir-se perfeito e para mim, só havia olhos para "ele"... fazia-o rir, sorrir... fazia-o sentir-se completamente à vontade para ser ele próprio, dava-lhe luta sexual, aumentando a quimica... era igual em tantas coisas, tinha tanta (ou mesmo tudo) coisa em comum.. Mas.. Não passava duma boa amiga! Aquela que tem tudo.. mas que não passa disso mesmo.. duma amiga! Amor por mim era algo que nunca ía haver dentro daquele peito definido. Sentei-me numa esplanada e chorei... compulsivamente, enquanto o Rui comprava fatos da Hugo Boss.

O jantar com a Pilar e com o Rui decorreu maravilhosamente... Notei um ligeiro flirt entre os dois o que me deixou bastante contente. Ambos eram 2 pessoas que eu gostava bastante e vê-los "vivos" deixava-me bastante aliviada. Embora quase me tenham forçado, não consegui acompanhá-los para o "The Temple", bar da moda em NY. Seguiram os 2 e eu caminhei a pé mais de 10 quarteirões até minha casa... Sei que foi um caminho de quase duas horas... Não parava de pensar "nele"... nos olhos raros, côr de mel com raios verdes, ténues, quase invisivéis que me hipnotizavam... Na voz envolvente, provocando um efeito mais quente que muitos cobertores... Nas mãos estranhas... mas com o gestuar mais bonito que alguma vez vi... Nos nós de gravata que lhe fiz, nas gargalhadas que demos juntos... Nos sorrisos cumplices e nas vezes que acabámos a frase um do outro.

Sábado era o último dia do Rui em NY... O seu vôo seria na madrugada de domingo às 5h da manhã. Tínhamos combinado jantar juntos, uma vez que ele ía aproveitar para almoçar com um amigo antigo que também trabalhava em NY numa empresa de meios de comunicação.
Tirei o dia para ter uma relação de amor com a minha cama, a minha manta polar, o meu chá e os meus DVD's românticos... Desde Love Actually a Moulin Rouge, o meu dia tinha sido altamente produtivo. O meu telemóvel continuava num voto de silêncio... e quando tocava, eu bem que tremia e o procurava rapidamente, mas... nunca era "ele"...

Acabei por adormecer e acordar já atrasada para o jantar de despedida do Rui... Íamos jantar ao Food Colection, um dos restaurantes da moda em NY. Quis proporcionar-lhe um jantar de despedida digno depois de ter estado comigo 5 dias.
Tomei banho rapidamente, estiquei o cabelo e maquilhei-me muito ao de leve... Um traço fino nos olhos, rímel e gloss... Decidi vestir-me bem, embonecar-me, não pelo Rui obviamente, mas por mim... Que estava a deixar-me perder na tristeza... tal como há 6 anos atrás. Usei um vestido preto e branco, um colar longo de pérolas e uns saltos proeminentes que quase me atraiçoavam quando desci as escadas da fachada da pensão para apanhar o táxi.

Cheguei 15 minutos atrasada... claro! No táxi procurei o meu telemóvel para lhe enviar um sms a avisar, mas tinha-o deixado em casa... Odeio andar a correr dum lado para outro, acabo sempre por me esquecer de alguma coisa. Fiquei breves segundos em pânico... e se "ele" me decidisse enviar sms nessa noite? Ou ligar-me?

Ao chegar ao restaurante, percebi que estávamos sentados na parte mais restrita do restaurante... confesso que senti um arrepio pela coluna... Aquela situação não era muito do meu agrado. Ao sentir o meu toque no seu ombro, o Rui levantou-se e cumprimentou-me duma forma que há muito tempo não fazia... Entrelaçou os seus dedos no meu cabelo atrás da nuca e olhou-me com desejo... exclamou "estás lindíssima, como sempre, aliás..." - Achei automaticamente que o jantar não ía correr bem.
A verdade é que em circunstâncias normais, íriamos acabar na cama naquela noite... ele era lindo, cativante, mas... eu não o amava! Aliás, nunca o tinha amado... E actualmente, tinha-lhe um carinho de amizade tão forte que toda aquela tentativa de flirt estava a deixar-me nauseada... e acabou por fazer com que a minha presença naquele jantar não durasse mais que 40 minutos...
"Vem comigo para Lisboa Catarina! Sabes que só vim aqui porque ainda te quero... A minha filha continua a perguntar por ti ao fim de 6 anos. És tu que quero ao meu lado... sabes que tens tudo se ficares comigo, até podes deixar de trabalhar se quiseres!"
Sorri... tristemente, desiludida...
"Foi um prazer conhecer-te Rui... acredita que sim! Mas... não é a ti que eu amo..." - e nesse momento... foi quando percebi que o amava... a "ele"... sim... eu amava-o!
Levantei-me, pedi o meu casaco ao empregado enquanto o Rui estava preso à cadeira... dei-lhe um beijo no lado direito da cara e despedi-me... "Boa viagem e até um dia meu querido!"

Saí do restaurante e comecei a gargalhar sozinha no meio da rua... Todos que passavam me olhavam e deviam pensar que eu estava bebeda, certamente! Sim...estava... bebeda de amor, de paixão, de fantasia, de certezas, de saudades...
Ía dizer-lhe... estava decidido... ía contar-lhe tudo o que sentia, mesmo que não fosse recíproco! Ía-lhe dizer-lhe que o amava, que o queria a meu lado, que queria que ele fosse o pai dos meus filhos, que queria lutar com ele, levantá-lo quando ele caísse, aplaudi-lo quando triunfasse... fazer-lhe torradas quando acordasse, afagá-lo no meu peito quando tivesse febre e engripado... queria-o simplesmente...ou totalmente!

Ao caminhar de regresso à minha pensão, mais uma vez a pé, decidi cortar caminho e passar por casa da Pilar..queria contar-lhe a minha decisão! Passei por um acidente... felizmente, não vi a pessoa em questão, mas apercebi-me que tivera sido um atropelamento e aparatoso... havia sangue no chão e restos de materiais dos bombeiros... compressas, gazes, tubos... Caminhei rápido sem olhar, sangue e eu não era a melhor combinação.

Pilar não estava em casa...não havia problema... continuei a sorrir e a caminhar pelas ruas.. Sentia-me livre, a flutuar.. finalmente percebi que o amava...

Quando cheguei, não liguei a mais nada a não ser à minha cama... deitei-me tal e qual como cheguei... Não me desmaquilhei, somente me descalcei... queria dormir, finalmente... ao fim duma semana sem dormir em condições... e amanhã, cedo queria ir a casa dele... Levaria pequeno-almoço e abriria o meu coração.... Adormeci automaticamente.

Umas horas mais tarde o meu telemóvel tocou... Dei um salto e procurei-o por toda a parte, pensando ser ele... Enquanto procurava, lembrei-me que ele talvez já tivesse ligado, mas que eu nem me tinha lembrado de verificar quando cheguei a casa... Era um número anónimo... Quando atendi, ouvi do outro lado:

“Estou sim? Estou a falar com a Catarina Gonçalves? É do NewYork-Presbyterian Hospital, lamento ligar-lhe mas ocorreu um acidente…"

Deixei cair o telefone... e tombei no chão do meu quarto...

O acidente que eu vira horas antes... era "ele".....

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