terça-feira, 6 de julho de 2010

O Sonho - IV

Algumas das coisas boas que tinha aprendido nestes 6 anos era a controlar-me, a conseguir ser ligeiramente racional e fria. Para mim era um ganho fenomenal, acreditem.

Quando abri aquele email o meu estomâgo contorceu-se em mil voltas. A verdade é que já estavamos em NY practicamente há 4 semanas e ainda não tinha havido nenhuma conversa entre nós, somente coisas banais e básicas, como o preço das coisas, a qualidade da comida e essencialmente trabalho.
Daquilo que o conhecia, não podia deixar de estar totalmente surpresa... Tal como tinha dito à Rute, para estar com ele um dia, teria de ser eu a convidar e tinha 98% de certeza que ía ser recusado. "Ele" era uma pessoa rancorosa, distante, fria e extremamente racional. Se não nos falávamos há 6 anos, não esperava qualquer tipo de aproximação.

"Obrigada Sr. Director Comercial, mas para hoje já tenho planos." - a verdade é que não tinha, mas não queria que ele pensasse que eu queria estar com ele. Queria que ele pensasse que para mim, era-me indiferente a presença dele ali. Indiferente relativamente ao passado, porque queria que ele sentisse que eu estava feliz por ele, não queria era reprecursões ao passado. Não sei como foi a reacção dele quando leu a minha resposta, mas saíu primeiro que eu e limitou-se a dizer um "até amanhã" seco a mim e a Pilar.
Nesse momento, lembrei-me e foi a minha vez de desafiar Pilar para uma cerveja. Pobre mulher, desde que me conhecera que me convidava e eu sempre recusei. Hoje precisava de me rir e de estar com uma pessoa que podia vir a ser uma amiga.

Encaminhámo-nos para um bar em Soho... O bairro da moda desde sempre em NY. Mantinha-se esse "cliché" e a verdade é que era de sonho. Montras de Jimmy Choo, GAP, YSL... era de uma mulher ficar com dores de cabeça só de fixar as montras coloridas e iluminadas. As pessoas que por ali se passeiam são bonitas, elas de elegantes saltos altos, eles com roupa cara e fashion. Era tão fácil ser feliz em NY...
Entrámos no WonderBar. Pilar conheceu este bar com o seu amigo "sem compromisso" John. Americano de raízes italianas, lindo de morrer. Moreno, alto, barba, olhos negros e penetrantes, boca delineada e corpo de modelo. Eram felizes assim... Saíam para jantar, para dançar e de vez em quando passavam a noite juntos. Ambos pensavam inteiramente na carreira e era isso que queriam manter. A mim, este tipo de relação fazia-me "cócegas" no cérebro... como é possível não se apaixonarem?!

"Então, mas conta-me lá... o que é que se passou entre ti e o nosso director comercial no passado?"
Engasguei-me automaticamente com o meu Grasshopper.
"Hum... Porque me perguntas isso?"
"Ora.. está mais do que na cara Catarina. A maneira como vocês olham um para o outro denuncia aí qualquer coisa. E aliás, o facto de fugires dele, ainda mais."
"Fomos colegas de faculdade...só isso!"
"Só isso?! Mulher... a mim não me enganas tu, mas vou esperar para que me queiras contar a história. Mas olha, dou-te um conselho... se nunca se passou nada, é bom que faças por passar, porque ele é bem giro. E tem uma forma de te olhar que até a mim me arrepia."
Acabámos as duas a rir alto com aquela sua forma tão espanhola de falar, graciosa e divertida.

Quando cheguei a casa liguei à Rute... Precisava de lhe contar as novidades chocantes do dia. Ao contrário do que esperava, ela não ficara chocada:
"Estava a ver que nunca mais te convidava para jantar!"
"Então mas tu achavas que ele o ía fazer?"
"Sempre te disse que também não estava a ser fácil para ele... E também sempre te disse que achava que essa história não estava acabada!"
"Neste momento estou arrependida de não ter aceite o convite..."
"Não estejas... mas prepara-te que agora és tu a ter de convidar."

Esperei 3 dias até fazer o convite... Não, não estava a fazer charme... estava mesmo a criar coragem. Escolhi uma sexta feira porque saímos sempre por volta das 5 horas do hotel e assim tinha tempo de ir à pensão mudar de roupa.
Foi um completo dilema escolher o que vestir.. não queria ir demasiado arranjada, mas também não queria ir demasiado formal.
Acabei por escolher uns jeans direitos, com uma blusa acetinada, bem decotada, cinzenta e azul escura, finalizando com uns belos saltos altos cinzentos com "mini-mala" a condizer.
Tinhamos combinado no Starbucks perto do hotel às 7 horas. Estava a chegar o Outono... ainda se podia andar de roupa fresca, mas a noite pedia já um ligeiro abrigo.
Quando o vi, sei de antemão que ele reconheceu o meu olhar embora há muito tempo não o visse. Jeans, camisa preta e um casaco cinzento... Nem muito formal, nem muito descontraído... estava aquilo que os nova iorquinos chamavam de "casual chic". Lindo e sexy, resumidamente!
A verdade é que ambos estavamos diferentes. Os 6 anos tinham passado por nós duma forma fabulosa. Quem nos visse a passear lado a lado naquelas ruas de NY sabia que erámos pessoas de negócios concretizadas, que tinham lutado para estar ali, com uma boa qualidade de vida e uma carreira promissora.

"Olá Sr. Director Comercial" - Não pude deixar de sorrir com vontade... era bom estar ali!
"Sra. Directora de Eventos, como está?!" - era bom vê-lo brincar comigo. - "Vamos? Temos reserva para as 8h30 num sítio que vais gostar."
Isto lembrou-me as vezes que ele me chamara cosmopolita... as vezes que tinhamos discutido por causa disso. Mas sim, estava na altura dele se ter tornado cosmopolita também. Perguntou-me se eu aguentava os saltos altos para andar um pouco... rimos os dois antes da minha resposta... "Sim, acho que sim... sabes que as mulheres cosmopolitas andam sempre de táxi, mas vamos tentar!" - nesse momento, foi a primeira vez que nos olhámos nos olhos ao fim de 6 anos... aquela nossa forma de olhar, aquela nossa cumplicidade, aquela nossa ligação especial...
Ele encaminhou-me para o restaurante, através do Central Park... Basicamente, tínhamos 1 hora para passear por ali, até chegar ao Don Guiseppe, um dos restaurantes italianos mais famosos de NY.

A verdade é que tive de me agarrar a ele passados uns largos minutos. O chão irregular estava a começar a fazer com que eu ficasse para trás... Pedi-lhe desculpa e dei-lhe o braço. Nesse momento, olhei em frente, no horizonte... O céu estava vermelho, com reflexos laranjas, amarelos e pinceladas de roxo... O sol escondia-se por detrás dos prédios altos e robustos da cidade. Começava a ver-se a lua, cheia, a aparecer discretamente, de uma cor ocre. As árvores dançavam subtilmente com o vento fraco. Era um espectaculo divino, ver os raios de sol a perfurarem os espaços vazios entre os prédios, iluminando as folhas do Central Park, deixando-as douradas.

Não podia acreditar... ao fim de 6 anos, voltava a ver um pôr do sol com "ele", mas agora... em NY!

2 comentários:

  1. Nao consegui resistir...o nome do restaurante diz muita coisa lol

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  2. Ahahah... Só agora é que vi que comentaste...LOL!
    Pois amiga... eu tenho de ir buscar nomes a algum lado n é? E se falamos em italianos, é impossível não me lembrar deste nome... MUAHAHAH!! =)

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